Dados e Sonhos.
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A perda da inocência-Um conto Rashemen.

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A perda da inocência-Um conto Rashemen. Empty A perda da inocência-Um conto Rashemen.

Mensagem  Camila MacAiren Qua Jul 02, 2014 8:46 pm


Perdido nas brumas da manhã, o sol despertava preguiçoso naquele dia sombrio, não ligava para os exércitos alinhado em campos diferentes, nem para o medo que pairava por sobre aquele vasto campo de grama verde.
Apenas queira mostrar sua cara e lançar sua luz sobre todos.
A fronteira estava ameaçada, novas tropas de Thayanos com seus temíveis exércitos de abomináveis criaturas, espreitava o pequeno grupo de guerra dos rashemi.
Magos de túnicas vermelhas como sangue, cavaleiros de armaduras cruéis, espreitavam, esperando que o toque de atacar fosse ouvido, esperavam pela liberdade de matar.
Em uma pequena elevação, uma mulher vestida de sedas verdes, com um bela máscara adornada de penas negras, olhava a vasta força que vinha tentar tomar sua terra, já se passaram anos entre o ultima vez que vira um contingente daquele tamanho ameaçar sua fronteira, tinha reunido suas tropas, seus bárbaros e bruxas, sabia que tinha um longo dia pela frente, um dia sangrento, mas parece que os Deuses não estavam de mal humor, o dia prometia ser quente e lindo, sempre achava que lutar na primavera era um desperdício de tempo, sangue não combinava com flores.
Voltando-se para as mulheres e homens que ali aguardavam, lhes sorri, eram a elite de suas forças, cada um entre eles testados em batalhas, cada um disposto a dar a vida pelo bem de sua terra, sabiam que eram a esperança e proteção, para com aqueles que não podiam lutar.
Seus olhos percorrem cada rosto ali, guardando na memoria, sabia que ao final do dia, muitos desses rostos, estariam perdidos para a morte, e a cada um que encarava, via determinação e coragem.
Parando o olhar num pequeno grupo de jovens, que iriam ter seu batismo de sangue, sente o coração apertar, eram do seu sangue, o menino e a menina, com tão poucas primaveras, já estavam afiando armas e repassando táticas, sempre é cedo demais para se encarar a guerra, mas não podia poupa-los disso, o caminho de um rashemi, é a guerra.
Deixaria para depois o remorso, ali ela era a senhora da batalha, teria que acalmar o coração, deixa-lo na tenda, quando baixa-se a máscara, só restaria a luta.
Um toque em seu ombro a trás de volta de seus devaneios.
Seu neto mais velho estava parado a sua frente, esperava ordens.
Alto e feroz, usava calças de tecido grosso, bem como um grande cinturão de ferro, protegendo seu abdômen, as cicatrizes se misturavam com as tatuagens de seus feitos.
Era seu comandante bárbaro.
-Senhora, esperamos pelas ordens de posicionamento, as bruxas aguardam para formar os círculos e preparar a barreira.
Olhando a movimentação inimiga, faz um aceno com a cabeça.
-Já começou, peça uma formação defensiva, veja se as curandeiras estão prontas, e posicione os arqueiros para o flanco direito, lá estão os bastardos vermelhos, derrubem eles antes.
Contenha seus homens, deixe a fúria fluir somente depois de abrirmos caminho até o centro da formação inimiga.
O grande bárbaro faz uma reverencia e segue com suas ordens.
Posicionada logo atrás da pequena elevação de terra, tendas
de tecido branca com pequenas estruturas de madeira aguardavam os feridos.
Onde dois jovens conversavam animados:
-Acho que a vovó vai fazer chover, ela sempre faz chover, assim fica mais fácil fritar os vermelhos, diz o animado rapaz, sua barba ainda é rala, e tem poucas tatuagens e um sorriso enorme no rosto, seus longos cabelos negros estão presos em duas tranças. Segura um machado duplo e tem um arco no ombro.
-Pois eu acho que não, diz a moça com petulância, o dia está bonito demais para chuva, veja as flores na campina, elas esperam o sol.
Enquanto falava, cortava pedaços de tecido pra ataduras, seus dedos ágeis trabalhavam rápidos e firmes, ela veste um túnica branca, como as das clérigas, mas tem marcas azuis pelo braço, indicando que era uma iniciada das Hathrans. Era um pouco mas jovem que rapaz e tinham os mesmo olhos rasgados, sendo que o dela era cinza e o dele negro.
Estão tão entretidos em discutir um com o outro que nem notam a grande figura parar ao lado deles e se assustam quando ouvem sua voz de trovão:
-Maera, Jonas, parem de frivolidades, não é hora para isso, os arqueiros estão se posicionando, e espero que lembre que lá é seu posto, e você mocinha, não ouse sair daqui, sua função é cuidar dos feridos, foi esse o acordo com papai, não nos desobedeça, ou nem seus doces olhos vão lhe salvar de uma boa surra.
Não foi minha vontade que vocês estivessem aqui, mas a Senhora assim o quis, e não pude fazer nada, então se comportem, ou vou fazer picadinho dos dois.
A guerra é algo feio, e em breve vão descobrir.
Obedeçam seus comandantes, fiquem fora de encrenca, e se eles passarem pela barreira, Jonas tire essa menina daqui, corra o mais rápido que puderem, e se escondam.
O bárbaro olha intensamente para os dois, tinha muito com que se preocupar, pra lidar com aquelas pestes em uma batalha, tinha implorado ao pai que intercedesse com o Senhor do Ferro, para que eles não fossem convocados, eram jovens demais pra ter seu batismo de sangue em uma situação dessa, mas nada pode fazer, o jeito era deixa-los aos cuidados de outros mas experientes que eles, e rezar para que não se firam demais.
Em um impulso, abraça o rapaz, e a menina, tocando sua longa trança com carinho.
Vira-se e vai para seu posto, ordens precisavam circular, olhando por sobre o ombro, vê os dois discutindo e rindo, seu peito pesa como chumbo, eram crianças ainda, seus irmãos mais novos, isso lhe dava motivos extras para lutar.
Como se esperasse um sinal o sol rompe a nevoa e o ataque começa.
As Bruxas formam círculos, barreiras são erguidas, para proteger as conjuradoras mais poderosas, bárbaros tomam seus lugares a frente de suas senhoras, soldados e arqueiros pegam suas armas.
Uma leva de monstros e soldados avançam pela campina, indiferente as flores que são pisoteadas por pesadas botas e garras, e o sangue é derramado de ambos os lados.
Em um momento o inferno se faz presente ali.
Raios e magias desgovernadas, rebatem em escudos e barreiras, baixas começam aparecer dos dois lados.
Stella junto ao seu circulo evoca ventos e raios contra seus inimigos, derrubando e eletrocutando dezenas deles.
Suas bruxas lhe dão apoio, seus bárbaros lhe dão proteção.
Logo a campina é um local de enormes crateras, e cheiro de corpos carbonizados.
Quando a magia para, o som de laminas se faz presente, gritos de fúria e dor se misturam, mas parece que pra cada inimigo que cai, outros dois tomam o lugar.
Jonas está sem flechas, sacando o machado parte junto com outros guerreiros para o corpo-a-corpo, sendo por um breve momento engolido pela batalha.
Maera está ocupada, a cada instante mais ferido chegam, alguns em estado tão critico que só a magia pode salvar, em pouco tempo sua túnica está lavada de sangue, e seus braços vermelhos do mesmo.
Seus olhos vasculham o campo a procura de Jonas, seu corpo treme de medo por não vê-lo.
E como era esperado, os magos começam uma cantoria amaldiçoada, e seus homens mortos voltam a vida, levantados como criaturas saídas de um pesadelo.
A linha de defesa Rashemi quase verga com esse novo horror, mas as clérigas começam a agir, e a balança se equilibra novamente.
Vendo que sua linha de defesa está prestes a ser rompida, e que a maioria dos magos ainda está de pé, Stella toma uma decisão difícil, atacar o cerne daquela força invasora.
Com um gesto imperioso, chama sua guarda de honra e aponta para o inimigo, sabia que eles iriam morrer, mas precisava do caminho livre para atacar.
Askell vendo a ordem ser proferida e como integrante da guarda, toma seu lugar na linha de frente, seus olhos cruzam com o de sua avó, ele sabe que não vai ser fácil atravessar aquilo, e que a morte vai fungar em seu pescoço, mas ordens são ordens, só esperava que as crianças estivessem bem.
A custo de muitas vidas a linha dos Thayanos é rompida, e um sopro de esperança enche o coração de Askell, poderia vencer, poderia viver, mas quando a sorte parecia lhe sorrir, novos dados são lançados, e um horror inominável lhe enche a alma.
Saído das entranhas da terra, entre chamas e morte, surge um demônio vermelho, alto como uma arvore e forte como um touro.
Seus homens arfam, e alguns seguram suas armas com mais força, a fúria toma a mão de vários e ele sabe que essa luta vai ser a morte de todos ali.
Stella seguia com seus bárbaros e empalidece ao ver a abominação saindo da sua terra, aquilo era um ultraje e aqueles magos iriam pagar por isso.
Buscando o poder dentro de si, se lança em um ataque feroz contra aqueles que ousaram macular sua terra.
Vendo-se perto da batalha com o demônio, Jonas sente as pernas fraquejarem, era mais do que podia morder, sentido cada corte e a perda de sangue, vê seu irmão engajado contra o inimigo infernal, seus olhos brilham e a fúria contida a custo, lhe escapa e gritando ataca a monstruosidade vermelha.
Maera já não pode mais ficar ali, sem ver seus irmãos, deixa seu posto junto aos feridos e os procura entre os combatentes, seus joelhos perdem a força ao ver seus irmão engajados na luta contra o demônio, tenta correr mas é impedida por um dos guardas das tendas, aos gritos esperneia e tenta se libertar, eles precisavam dela, sabia usar o machado, podia ajudar...
A cada passo mais inimigos cercam a velha Othlor, era isso que esperava, venham pensava, em breve tudo isso vai acabar.
Seus netos lutavam ao pé do demônio, o menino intrépido estava caído, seu irmão o defendia como podia, só tinha tempo de salvar um, e a escolha era uma faca em seu coração.
Lutando contra as lágrimas, conjura um cervo de fumaça e o manda para perto dos meninos.
A cada golpe da criatura, sente sua força minar, só uma vontade férrea lhe mantem de pé, ver Jonas cair diante das garras do inimigo, lhe dá um novo animo nos ataques, já estava pronto para dar mais um potente golpe com seu machado, quando percebe a aproximação do cervo, entenderá o recado, dando as costas para o demônio, pega seu irmão caído e o coloca nas costas da criatura, ela iria soltar o inferno ali, um deles iria viver, com um toque cuidadoso afasta o cabelo do irmão do rosto, olhando pela ultima vez aquele menino.
Mas um dos seus cai, enquanto o cervo foge lépido na direção das tendas.
Seu olhar busca o de sua Senhora, só para confirmar suas suspeitas, ela preparava a defesa final.
Seu ultimo pensamento antes de tudo virar luz é, de crianças rindo em volta de si, do toque suave de sua esposa, e de seus delicados cabelos ao vento...
Os magos comemoram quando a bruxa cai, mal sabem que tudo é um engodo, ela tira a máscara e eles enxergam a morte em seus olhos, tentam correr mas é tarde demais, a fúria da tempestade está sobre eles, seus corpos viram pó, que é soprado pelo vento feroz que gira ao redor, a Senhora de Rashemen cai intocada pela destruição a sua volta, a batalha fora vencida, a custas de muitas vidas, sua terra estava salva, seus olhos se fecham, e sua máscara cai por terra, sendo levada pelo vento.
Na colina o cervo chega, depositando sua preciosa carga aos pés de uma moça em pranto, abraçando o corpo, lhe embala, mãos gentis lhe levantam, mulheres cuidam de seu irmão.
Os inimigos estão mortos ou morrendo, a campina a sua frente está destruída, o vento jogou flores e corpos por todos os lados.
Nem sabe dizer quanto tempo ficou ajoelhada em frente aquela destruição, só se lembra de ter sido levada para junto dos sobreviventes.
Seu irmão Jonas fazia desacordado, porem tratado, quando começam as buscas por sobreviventes vai junto, precisava fazer algo, ou a dor iria lhe enlouquecer.
Acha o corpo de Askell soterrado debaixo da carcaça do demônio, com ajuda o tia de lá, seu grito é ouvido por todos,
Abraçando-o chora até não restar lágrimas.
O semblante dele está em paz, é quase uma afronta a aquela destruição.
O sol que era tímido naquela manhã, se torna forte e inclemente, parecia zombar de sua dor.
E um pensamento lhe cruza a mente, não deveria ser permitido mortes em um dia tão bonito como aquele.
Deixando levar o corpo, procura por sua avó, mas outros já retiraram dali.
Nada lhe resta a não ser voltar e tentar ajudar.
A imagem daquele campo de morte ficou gravada em seu coração, sabia que nunca iria esquecer
Tinha testemunhado uma resistência rara, onde se escolhe a morte, para que a vida continue.



Tempos depois, antes de sair em sua Dajemma, volta aquele campo, as flores cresceram fortes e vistosas, e onde antes era uma desolação, a vida reivindicou o direto de ali voltar.
Parando no local onde seu irmão tombou, deixa um pequeno urso entalhado habilmente na madeira, era uma lembrança para ele, tocando no machado que um dia lhe foi dado, deixa as lágrimas caírem soltas, ainda não tinha se acostumado com a falta dele, de sua voz trovejando pela casa, de seu riso fácil e seu jeito de olhar generoso.
Conta que vai sair em Dajemma, que ele não precisa se preocupar, que ela sabe usar o machado, e se cuidar, conta sobre seus filhos, e o quão fortes estão se tornando.
Fala que Jonas está bem, e apaixonado, deixa as lembranças que Svana lhe mandou, e um garrafa de jhuild.
Seca as lágrimas e segue seu caminho.
Olha para onde sua avó tombou, mas não tem palavras boas para ela, era uma mulher dura, que aceitava o preço de suas escolhas, mesmo que essas levassem a derramar seu próprio sangue.
Tinha aprendido uma lição que levaria para toda vida.


“As escolhas eram facas que ficavam cravadas no coração, até que um dia não restaria mais escolhas ou coração.”
Camila MacAiren
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